domingo, 22 de maio de 2016

QUICUMQUE "Credo de Santo Atanásio"

Primeiro, leia, sem preconceitos, as palavras de Santo Atanásio:



Quem quiser salvar-se deve antes de tudo professar a fé católica.
Porque aquele que não a professar, integral e inviolavelmente, perecerá sem dúvida por toda a eternidade.

A fé católica consiste em adorar um só Deus em três Pessoas e três Pessoas em um só Deus.

Sem confundir as Pessoas nem separar a substância.
Porque uma só é a Pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo.

Mas uma só é a divindade do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, igual a glória e coeterna a majestade.
Tal como é o Pai, tal é o Filho, tal é o Espírito Santo.
O Pai é incriado, o Filho é incriado, o Espírito Santo é incriado.
O Pai é imenso, o Filho é imenso, o Espírito Santo é imenso.
O Pai é eterno, o Filho é eterno, o Espírito Santo é eterno.

E contudo não são três eternos, mas um só eterno.
Assim como não são três incriados, nem três imensos, mas um só incriado e um só imenso.

Da mesma maneira, o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente.
E contudo não são três onipotentes, mas um só onipotente.

Assim o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus.
E contudo não são três deuses, mas um só Deus.
Do mesmo modo, o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor.

E contudo não são três senhores, mas um só Senhor.
Porque, assim como a verdade cristã nos manda confessar que cada uma das Pessoas é Deus e Senhor, do mesmo modo a religião católica nos proíbe dizer que são três deuses ou senhores.

O Pai não foi feito, nem gerado, nem criado por ninguém.
O Filho procede do Pai; não foi feito, nem criado, mas gerado.
O Espírito Santo não foi feito, nem criado, nem gerado, mas procede do Pai e do Filho.

Não há, pois, senão um só Pai, e não três Pais; um só Filho, e não três Filhos; um só Espírito Santo, e não três Espíritos Santos.
E nesta Trindade não há nem mais antigo nem menos antigo, nem maior nem menor, mas as três Pessoas são coeternas e iguais entre si.

De sorte que, como se disse acima, em tudo se deve adorar a unidade na Trindade e a Trindade na unidade.

Quem, pois, quiser salvar-se, deve pensar assim a respeito da Trindade. Mas, para alcancar a salvacão, é necessário ainda crer firmemente na Encarnação de Nosso Senhor Jesus Cristo.

A pureza da nossa fé consiste, pois, em crer ainda e confessar que Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus e homem. 
É Deus, gerado na substância do Pai desde toda a eternidade; é homem porque nasceu, no tempo, da substância da sua Mãe.

Deus perfeito e homem perfeito, com alma racional e carne humana. Igual ao Pai segundo a divindade; menor que o Pai segundo a humanidade.

E embora seja Deus e homem, contudo não são dois, mas um só Cristo. É um, não porque a divindade se tenha convertido em humanidade, mas porque Deus assumiu a humanidade.

Um, finalmente, não por confusão de substâncias, mas pela unidade da Pessoa.
Porque, assim como a alma racional e o corpo formam um só homem, assim também a divindade e a humanidade formam um só Cristo.

Ele sofreu a morte por nossa salvação, desceu aos infernos e ao terceiro dia ressuscitou dos mortos.
Subiu aos Ceus e está sentado a direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir a julgar os vivos e os mortos.
E quando vier, todos os homens ressuscitarão com os seus corpos, para prestar conta dos seus atos.

E os que tiverem praticado o bem irão para a vida e os maus para o fogo eterno.

Esta é a fé católica, e quem não a professar fiel e firmemente não se poderá salvar."

Bem, agora vejamos...

Mas como afirmar com a devida parresía as palavras desse Credo, de Santo Atanásio?

Afinal, já não se vive num universo cristão, onde a Fé pode ser pressuposta..., nem imposta, mas apenas e unicamente proposta de forma humilde.

Entretanto, o que diz Santo Atanásio é aquilo que o Mandato do próprio Senhor o diz: "quem crer e for batizado, ..., em Nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo."

Caberia recobrar todo o fundamento da Cultura Ocidental, tão degradada e deturpada por ideologias, as mais diversas, para com pureza e clarividência contemplar a limpidez das palavras de Santo Atanásio é seu mais profundo significado.

Caberia reencontrar a Cristo, fundamento do Ser, de todo ser, o olhar fundante, a Sabedoria que tudo cria e sustenta, a Misericórdia que não nos deixa cair no abismo da nulidade, a Justiça que nos faz elevar o olhar.

Caberia silenciar diante do burburinho do mundo e encontrar a Beleza, a Bondade e a Verdade que centraliza e unifica, em sua diversidade, todas as coisas.

Há ainda de ser lembrado que, no séc. IV, deuses eram considerados os imperadores, os mitos, as autoridades intelectuais. Atanásio, com expressões duras, se afasta violentamente de qualquer concepção mundana de deus, de tal maneira a condená-las e, nesse Credo, expurgá-las à condição de entidades condenatórias, ou seja, existem para nós escravizar e desconstruir o ser.

Mas esse movimento atanasiano não tem um quê de atual?

Repare nas ideologias, nos coletivismo, nas arrogâncias governamentais, nas fantasisas new age, nos vitimismos e movimentos de minorias, nos declarados validados, no humanismo laicista, que se encontra encurralado... Parece também que, no nosso tempo, os deuses imanentes chegam a seu ocaso e vergonha.

Não é à toa que, por causa desse Credo, muitos foram presos decapitados, queimados e perfurados. Eram ateus, com relação a toda sorte de deuses do mundo.

O cristão crê num Deus de tal modo a ser cético e ateu para o mundo...

Assim, há de se entender a Salvação como esse movimento de unificação e centralidade no Uno; a condenação, como a quebra, a ruptura, a perda de consistência do ser.

Se ainda assim, Cristo não for inteligível a você, caro amigo, cara amiga, não se desespere. Certamente, uma centelha de sua Bondade, Verdade e Beleza há de brilhar em sua vida. E é nesse Mistério, creia nEle, mesmo que não saiba que é Ele, que sua vida encontrará o Campo que a orienta.

Hoje, Solenidade da Santíssima Trindade é um dia dedicado a refletir sobre os Mistérios mais perfeitos. Mas, imperfeitos que somos, como o iremos alcançar? Somente se crermos que o Perfeito nos toma pela Mão e nos conduz a Ele.

Que Ele esteja com você. Um Santo Domingo!

quarta-feira, 9 de maio de 2012

"Por todos" ou "por muitos"? Bento XVI se pronuncia

Vale à pena ler o texto do link, comentado pelo jornalista italiano Sandro Magister, acerca de um discurso do Papa aos bispos alemães, que está em espanhol, sobre o uso do "pro multis" ("por muitos") ou do "pro omnibus" ("por todos"), nas palavras da Consagração na Santa Missa. Está também postado logo abaixo. Atenho-me a fazer apenas, por enquanto, um breve comentário meu, levando em consideração somente os pontos que enxerguei como mais relevantes numa leitura primária.

Como sempre, Bento XVI revela-se extremamente sensível e compreensivo ao lidar com assuntos delicados e procura se acercar de todos os parâmetros que se relacionam com o tema. Entretanto, na hora de atacar o problema, costuma ser cirúrgico e profundo. E, afinal de contas, o termo "pro multis" é dialeticamente correto, mas "pro omnibus" não é ontologicamente incorreto. Lá pelas tantas do discurso supracitado em espanhol, porém, o Santo Padre afirma primeiramente: "o temor reverencial da Igreja ante a Palavra de Deus e a fidelidade de Jesus ante a Escritura" - uma dupla fidelidade "é o motivo concreto da formulação "pro multis". Depois, leva o catéter mais a fundo: "Antes de tudo, para nós, que podemos sentar-nos a sua mesa, deve significar surpresa, alegria e gratidão por havermos sido chamados, por poder estar com Ele e podê-lo conhecer. (...) Em segundo lugar, há uma responsabilidade. A forma na qual o Senhor alcança aos outros – 'todos' – a seu modo, no fundo continua sendo seu mistério. (...) É indubitavelmente uma responsabilidade sermos chamados diretamente por Ele a sua mesa para poder ouvir: por vós, por mim, Ele sofreu. Os muitos têm a responsabilidade por todos. A comunidade dos muitos deve ser luz no candelabro, cidade sobre o monte, levedura para todos. Esta é uma vocação que conerne a cada um de manera completamente pessoal. Os muitos, que somos nós, devem ter la responsabilidade do conjunto, conscientes de sua missão."

Só por estas palavras, o discurso de Bento XVI já me soaria suficiente para, não só compreender o uso do "pro multis" ao invés do "pro omnibus" na Santa Missa, mas para ter uma compreensão, diria, uma contemplação mais apurada do Mistério Pascal. É isso que Bento XVI fez aqui: confirmou-me na fé, no sentido de que ofereceu-me a possibilidade de dar mais um passo e de encontrar o significado em amar mais, embora o desafio se torne maior ante tão grande dignidade e responsabilidade. Como não sou padre nem tenho vocação para isso, não posso fazer nada a não ser contemplar a beleza do Mistério, esforçar-me para aplicá-lo em minha vida a partir da graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, especialmente em minha família e em outros ambientes que frequento, e, ao menos, apontar aos sacerdotes que receberam o seu múnus a buscarem transmitir o que a Igreja pede de maneira correta, correspondente a esse ideal da vida em Cristo. Mas vamos ao terceiro ponto em que Bento XVI penetra:

"Por último, pode-se observar um terceiro aspecto. Na sociedade atual temos a sensação de não ser em absoluto "muitos", mas muito poucos, uma pequena massa que continua diminuindo. Pelo contrário, não: somos "muitos": "Depois disto, vi uma enorme multidão, impossível de contar, formada por gente de todas as nações, famílias, povos e línguas" (Ap 7, 9). Somos muitos e representamos a todos. Portanto, as palavras "muitos" e "todos" vão juntas e fazem referência uma à outra na responsabilidade e na promessa."

"Mas Bento XVI aqui não estaria sendo ingênuo?" - poderia perguntar meu interlocutor. De forma alguma: ele sabe das estatísticas. Aqui, ele referencia a Palavra de Deus, o Livro do Apocalipse, a Revelação. Só Deus sabe quantos são aqueles que foram salvos pelo Sangue precioso de seu Filho Amado, e revela-os como uma multidão no Apocalipse. O desejo de Deus é o de que todos sejam salvos, porém Ele sabe quantas possibilidades o homem carrega de responder ao dom da liberdade de maneira responsável. E diz o Filho: "esforçai-vos para entrar pela porta estreita, porque estreita é a porta que leva à vida, mas larga é aquela que conduz à perdição". Bento XVI aqui se põe como um de nós, um homem de fé, obediente à verdade, "cooperador da Verdade", como diz o seu lema, que se põe sob os auspícios do próprio Deus para afirmar, na fé católica, aquilo que a Igreja não pode renunciar.

Diário Vaticano / "Por muitos" ou "por todos"? A resposta justa é a primeira

Caros leitores, apresento-lhes um texto contido no blog do jornalista italiano Sandro Magister, aqui. Trata-se de um comentário ao discurso feito por Bento XVI aos bispos alemães recentemente, tendo o texto do discurso logo abaixo. Não tive como traduzir todo o texto por que a abreviação do tempo não mo permite, mas faço o comentário daquilo que vejo relevante na publicação do post que está logo acima deste. Se resolver ler, boa leitura:

Lo escribe Benedicto XVI a los obispos alemanes. Y quiere que en toda la Iglesia se respeten las palabras de Jesús en la última cena, sin inventar otras, como en los misales postconciliares. El texto íntegro de la carta del papa

de ***





CIUDAD DEL VATICANO, 3 de mayo de 2012 –  Las Iglesias de varias naciones en el mundo restablecen en la misa, una detrás de otra, las palabras de consagración del cáliz retomadas textualmente de los Evangelios y en  uso durante siglos, pero sustituidas en los últimos decenios, en casi todas partes, por una traducción distinta.

Mientras el texto tradicional en su versión base en latín dice todavía: "Hic est enim calix sanguinis mei […] qui pro vobis et pro multis effundetur", las nuevas versiones postconciliares han leído en el "pro multis" un imaginario "pro omnibus". Y en lugar de "por muchos" han traducido "por todos".

Ya en la última fase del pontificado de Juan Pablo II se había intentado, por parte de algunos, pocos, dirigentes vaticanos, entre los cuales Joseph Ratzinger, hacer revivir en las traducciones la fidelidad a "por muchos". Pero sin ningún éxito.

Benedicto XVI ha tomado personalmente en mano la cuestión. Prueba de ello es la carta que ha escrito el pasado 14 de abril a los obispos de Alemania.

La traducción íntegra de la carta está reproducida más abajo. En ella, Benedicto XVI resume los pasajes principales de la controversia, para motivar mejor su decisión de retomar una correcta traducción del "pro multis".

Pero para entender más a fondo el contexto, es útil recordar aquí algunos elementos.

*

En primer lugar, dirigiendo su carta a los obispos de Alemania, Benedicto XVI quiere dirigirse, por medio de ellos, también a los obispos de las otras regiones de lengua alemana: Austria, los cantones alemanes de Suiza, Tirol del Sur en Italia.

Si en Alemania, en efecto, la conferencia episcopal ha optado por traducir recientemente, aunque con fuerte resistencia, el "pro multis" no como "für alle", por todos, sino como "für viele", por muchos, en Austria no es así.

Y en Italia tampoco. En noviembre de 2010, en una votación, de 187 obispos votantes, sólo 11 se inclinaron por el "por muchos". A favor del "por todos" votó una mayoría aplastante, indiferente a las indicaciones vaticanas. Poco antes, también las conferencias episcopales de las dieciséis regiones eclesiásticas, con la única excepción de Liguria, se habían pronunciado para el mantenimiento de la formula "por todos".

En otras partes del mundo se está volviendo al uso del "por muchos": en América Latina, en España, en Hungría, en los Estados Unidos. A menudo con contestaciones y desobediencias.

Pero es evidente que sobre esto Benedicto XVI quiere ir hasta el fondo, sin imposiciones, pero exhortando a los obispos a preparar al clero y a los fieles, con una catequesis apropiada, a un cambio que, de todas formas, tendrá que llegar.

Después de esta carta es, por lo tanto, más fácil que también en las misas celebradas en Italia sea retomado el "por muchos", no obstante el voto contrario de los obispos en 2010.

La nueva versión del misal, aprobada por la conferencia episcopal italiana, está siendo actualmente examinada por la congregación vaticana para el culto divino. Y sobre este punto será seguramente corregida según las indicaciones del papa.

*

Una segunda anotación se refiere a los continuos obstáculos que el restablecimiento de una correcta traducción del "pro multis" ha encontrado en su camino.

Hasta el 2001, los fautores de traducciones más “libres” de los textos litúrgicos apelaban a un documento redactado en 1969 por el "Consilium ad exsequendam Constitutionem de Sacra Liturgia", del cual era secretario monseñor Annibale Bugnini, un documento no firmado e insólitamente redactado en francés, usualmente citado con sus primeras palabras: "Comme le prévoit".

En 2001, la congregación para el culto divino publicó una instrucción, "Liturgiam authenticam", para la recta aplicación de la reforma litúrgica conciliar. El texto, fechado 28 de marzo, estaba firmado por el cardenal prefecto, Jorge Arturo Medina Estévez, y por el arzobispo secretario, Francesco Pio Tamburrino, y había sido aprobado por Juan Pablo II en una audiencia concedida ocho días antes al cardenal secretario de Estado, Angelo Sodano.

Recordando que el rito romano "tiene un estilo y una estructura propias que hay que respetar en lo posible también en las traducciones", la instrucción recomendaba una traducción de los textos litúrgicos que fuese expresión "no tanto de ejercicio de una creatividad, como de cuidado por la fidelidad y la exactitud en la transmisión de los textos latinos en lengua vernácula". Las buenas traducciones – determinaba el documento – "deben estar desvinculadas de cualquier dependencia exagerada de modos expresivos modernos y, en general, de una lengua de tono "psicologizante."

La instrucción "Liturgiam authenticam" ni siguiera citaba el "Comme le prévoit". Y era una omisión deseada para quitar definitivamente a ese texto una autoridad y una oficialidad que no había tenido jamás.

Pero no obstante esto, la instrucción encontró una fuerte resistencia, también en el interior de la curia romana, tanto que fue incluso ignorada y contradicha por dos sucesivos documentos pontificios.

El primero es la encíclica de Juan Pablo II “Ecclesia de Eucharistia”, de 2003. En el parágrafo 2, allí donde se recuerdan las palabras de Jesús para la consagración del vino, se lee: "Tomad y bebed todos de él, porque éste es el cáliz de mi sangre, sangre de la alianza nueva y eterna, que será derramada por vosotros y por todos los hombres para el perdón de los pecados (cf. Mc 14, 24; Lc 22, 20; 1 Co 11, 25)". El "por todos" es ahí una variación que no tiene ninguna correspondencia en los textos bíblicos citados, evidentemente introducida oyendo las traducciones presentes en los misales postconciliares.

El segundo documento es la última de las cartas que Juan Pablo II solía dirigir a los sacerdotes cada jueves santo. Estaba fechada en el Policlínico Gemelli, el 13 de marzo de 2005, y en el cuarto parágrafo dice:

"«Hoc est enim corpus meum quod pro vobis tradetur». El cuerpo y la sangre de Cristo se han entregado para la salvación del hombre, de todo el hombre y de todos los hombres. Es una salvación integral y al mismo tiempo universal, porque nadie, a menos que lo rechace libremente, es excluido del poder salvador de la sangre de Cristo: «qui pro vobis et pro multis effundetur». Se trata de un sacrificio ofrecido por « muchos », como dice el texto bíblico (Mc 14, 24; Mt 26, 28; cf. Is 53, 11-12), con una expresión típicamente semítica, que indica la multitud a la que llega la salvación lograda por el único Cristo y, al mismo tiempo, la totalidad de los seres humanos a los que ha sido ofrecida: es sangre «derramada por vosotros y por todos», como explicitan acertadamente algunas traducciones. En efecto, la carne de Cristo se da « para la vida del mundo » (Jn 6, 51; cf. 1 Jn 2, 2)."

Juan Pablo II tenía la vida pendiente de un hilo, moriría unos veinte días más tarde. Y es a un papa en estas condiciones, sin ya ni siquiera la fuerza para leer, al que se le hizo firmar un documento en favor de la fórmula "por todos".

Este hecho contrarió a la congregación para la doctrina de la fe, a la cual ese texto no había sido previamente sometido. Tanto es así que pocos días después, el 21 de marzo, lunes santo, en una borrascosa reunión de los jefes de algunos dicasterios de la curia, el cardenal Ratzinger presentó sus protestas.

Menos de un mes después el mismo Ratzinger fue elegido papa, y anunciado al mundo con visible satisfacción por el cardenal Medina, el mismo que había firmado la instrucción "Liturgiam authenticam".

*

Con Benedicto XVI papa, el restablecimiento de una correcta traducción del "pro multis" se convirtió enseguida en un objetivo de su "reforma de la reforma" en campo litúrgico.

Él sabía que habría encontrado oposiciones tenaces. Pero en este campo nunca ha temido tomar decisiones firmes, como prueba el motu proprio "Summorum pontificum", de 2007, para la liberalización de la misa en rito antiguo.

Un dato de gran interés es la modalidad con la cual Benedicto XVI quiere actuar sus decisiones: no exclusivamente con órdenes perentorias, sino mediante convencimiento.

Tres meses después de su elección como papa hizo que la congregación para el culto, entonces presidida por el cardenal Francis Arinze, llevara a cabo un sondeo entre las conferencias episcopales para conocer su parecer sobre la traducción del "pro multis" con "por muchos".

Obtenidos estos pareceres, el 17 de octubre de 2006, por indicación del papa, el cardenal Arinze envió una carta circular a todas las conferencias episcopales enumerando seis razones a favor del "por muchos" y exhortándolas – allí donde la fórmula "por todos" estuviese en uso – a "iniciar la necesaria catequesis de los fieles" en vista del cambio.

Es la catequesis que Benedicto XVI sugiere llevar a cabo en particular en Alemania, en la carta por él enviada a los obispos alemanes el pasado 14 de abril, en la cual hacer notar que no le parece que esta iniciativa pastoral sugerida con autoridad hace seis años se haya iniciado jamás.

Dos notas al margen del texto papal: 1) El "Gotteslob" es el libro común de himnos y oraciones en uso en las diócesis católicas de lengua alemana. 2) La cita "Demos gracias al Señor que, por su gracia, me ha llamado a su Iglesia..." es el último verso de la primera estrofa de un canto recurrente en las iglesias alemanas: "Fest soll mein Taufbund immer stehen".

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"SOMOS MUCHOS Y REPRESENTAMOS A TODOS..."


¡Excelencia!
¡Reverendo, querido arzobispo!

En ocasión de su visita, el 15 de marzo de 2012, Usted me informó del hecho de que entre los obispos de lengua alemana aún no hay consenso en lo que se refiere a la traducción de las palabras "pro multis", en la oración del canon de la santa misa.

Parece ser que existe el peligro que en la nueva edición del "Gotteslob", cuya publicación se espera en breve, algunas partes del área lingüística alemana desean mantener la traducción "por todos", si bien la conferencia episcopal alemana está de acuerdo en escribir "por muchos", tal como desea la Santa Sede.

Le he prometido pronunciarme por escrito en mérito a esta importante cuestión, para prevenir una división en el lugar más íntimo de nuestra oración. Esta carta, que por medio de Usted dirijo a todos los miembros de la conferencia episcopal alemana, también va dirigida a los otros obispos del área de lengua alemana.

Permítanme unas breves palabras sobre cómo surgió el problema.

En los años sesenta, cuando el misal romano, bajo la responsabilidad de los obispos, tenía que ser traducido en alemán, existía un consenso exegético sobre el hecho que el término "los muchos", "muchos", en Isaías 53, 11 s., era una forma expresiva hebrea para indicar el conjunto, "todos". La palabra "muchos" en los relatos de la institución de Mateo y de Marcos era, por lo tanto, considerada un semitismo y tenía que ser traducida con "todos". Ello se extendió también a la traducción del texto latino, donde "pro multis", por medio de los relatos de los Evangelios, se refería a Isaías 53 y, por lo tanto, debía ser traducido con "por todos".

Mientras tanto este consenso exegético se ha desmoronado, ya no existe. En el relato de la última cena de la traducción unificada alemana de la Sagrada Escritura se lee: "Esta es mi sangre, el sangre de la alianza, versado por muchos" (Mc 14, 24; cfr. Mt 26, 28). Esto evidencia una cosa muy importante: la traducción de "pro multis" con "por todos" no es una traducción pura, sino más bien una interpretación que estaba, y sigue estando, bien motivada, pero es una explicación y, por lo tanto, algo más que una traducción.

Esta fusión entre traducción e interpretación forma parte, en cierto modo, de los principios que inmediatamente después del Concilio guiaron la traducción de los textos litúrgicos a las lenguas modernas. Se entendía hasta qué punto la Biblia y los textos litúrgicos estaban distanciados del mundo del lenguaje y del pensamiento actual de la gente, por lo que incluso traducidos continuarían siendo incomprensibles para cuantos participaban en las funciones. Un riesgo nuevo era el hecho que, a través de la traducción, los textos sagrados se abrirían allí, ante cuantos participaban a la misa y, sin embargo, seguirían estando muy distantes de su mundo, por lo que esta distancia sería aún más visible. Por lo que no sólo nos sentimos autorizados, sino también incluso obligados a incluir la interpretación en la traducción para así acortar el camino hacia las personas, cuyos corazones y mentes debían ser alcanzados por esas palabras.

En cierta medida, el principio de una traducción sustancial, y no necesariamente literal, de los textos fundamentales continua estando justificado. Al pronunciar a menudo las oraciones litúrgicas en varios idiomas, observo que a veces no hay casi similitudes entre las distintas traducciones, y que el texto común sobre el que se basan es, muchas veces, sólo lejanamente reconocible. Al mismo tiempo se han verificado banalizaciones que constituyen verdaderas pérdidas. Así, en el curso de los años, yo mismo he comprendido cada vez con mayor claridad que, como orientación para la traducción, el principio de correspondencia no literal, sino estructural, tiene sus límites.

Siguiendo estas intuiciones, la instrucción para los traductores "Liturgiam authenticam", promulgada el 28 de marzo de 2001 por la congregación para el culto divino, ha puesto en primer plano el principio de la correspondencia literal, sin que prescriba, por supuesto, un verbalismo unilateral.

La importante intuición sobre la que se basa esta instrucción es la distinción, ya citada al inicio, entre traducción e interpretación. Esa es necesaria tanto para las palabras de la Escritura como para los textos litúrgicos. Por un lado, la Palabra sagrada debe emerger lo más posible por sí misma, también con su lejanía y con las preguntas que conlleva. Por otro, a la Iglesia se le confía la tarea de la interpretación para que – en los límites de nuestra respectiva comprensión – nos llegue el mensaje que el Señor nos ha destinado.

Incluso la traducción más cuidada no puede sustituir a la interpretación: forma parte de la estructura de la Revelación el hecho que la Palabra de Dios sea leída en la comunidad interpretativa de la Iglesia, que la fidelidad y la actualización se vinculen entre ellas. La Palabra debe estar presente por sí misma, en su propia forma, quizás ajena a nosotros; la interpretación debe medirse en base a su fidelidad a la Palabra, pero al mismo tiempo debe hacerla accesible a quien la escucha hoy en día.

En dicho contexto, la Santa Sede ha decidido que en la nueva traducción del misal la expresión "pro multis" debe ser traducida como tal, sin ser interpretada. La traducción interpretativa "por todos" debe ser sustituida por la simple traducción "por muchos". Desearía recordar que tanto en Mateo como en Marcos no hay artículo, por lo tanto no "por los muchos", sino "por muchos".

Si desde el punto de vista de la correlación fundamental entre la traducción y la interpretación esta elección es, como espero, del todo comprensible, soy consciente que ella representa un desafío inmenso para todos aquellos a quien se ha confiado la tarea de explicar la Palabra de Dios en la Iglesia.

Para quien normalmente frecuenta la misa, esto parece casi inevitablemente como una fractura en el centro mismo del rito sagrado. Preguntará: pero Cristo, ¿no ha muerto por todos? La Iglesia, ¿ha modificado su doctrina? ¿Puede hacerlo, le está permitido? ¿Se esta llevando a cabo una reacción que quiere destruir la herencia del Concilio?

Gracias a la experiencia de los últimos cincuenta años, todos nosotros sabemos cuán profundamente la modificación de las formas y de los textos litúrgicos afecta el alma de las personas y, por lo tanto, cuándo un cambio en un punto tan central del texto puede inquietar a las personas. Justamente por esto, cuando ante la diferencia entre traducción e interpretación se eligió la traducción "muchos", se estableció también que en las diversas áreas lingüísticas la traducción debía estar precedida por una catequesis esmerada, con la cual los obispos debían explicar de manera concreta a sus sacerdotes, y por medio de ellos a los fieles, de qué se trataba.

Esta catequesis previa es el presupuesto esencial para la entrada en vigor de la nueva traducción. En lo que a mí concierne, en el área de lengua alemana, esta catequesis no ha existido hasta ahora. Mi carta quiere ser una petición urgente para todos vosotros, queridos hermanos, para preparar ahora dicha catequesis, y después hablar de ella con vuestros sacerdotes y, al mismo tiempo, hacerla accesible a los fieles.

En esta catequesis hay que aclarar brevemente sobre todo por qué en la traducción del misal, después del concilio, la palabra "muchos" ha sido traducida por "todos": para expresar de manera inequívoca, en el sentido deseado por Jesús, la universalidad de la salvación que llega de él.

Entonces surge enseguida la pregunta: si Jesús ha muerto por todos, ¿por qué en las palabras de la última cena Él ha dicho "por muchos"? Entonces, ¿por qué insistimos sobre estas palabas de Jesús de la institución?

Antes de nada, a este punto hay que precisar que, según Mateo y Marcos, Jesús ha dicho "por muchos", mientras según Lucas y Pablo ha dicho "por vosotros". Ello parece estrechar aún más el círculo. Pero justamente a partir de aquí nos podemos acercar a la solución. Los discípulos saben que la misión de Jesús les trasciende a ellos y al grupo; que él ha venido para reunir a los hijos de Dios de todo el mundo que estaban dispersos (Jn 11, 52). Las palabras "por vosotros" hacen que la misión de Jesús sea muy concreta para los presentes. Éstos no son un elemento anónimo cualquiera de un conjunto inmenso: cada uno de ellos sabe que el Señor ha muerto por él, por nosotros. "Por vosotros" se extiende en el pasado y en el futuro, se dirige a mí personalmente; nosotros, que estamos aquí reunidos, somos conocidos y amados como tales por Jesús. Por lo tanto, este "por vosotros" no es una reducción, sino más bien una concretización que vale para cada comunidad que celebra la eucaristía, que la une de manera concreta al amor de Jesús. El canon romano ha unido entre sí dos expresiones bíblicas en las palabras de consagración, y por lo tanto dice: "por vosotros y por muchos". Esta formula, con la reforma litúrgica, ha sido adoptada después para todas las oraciones eucarísticas.

Pero, de nuevo: ¿por qué "por muchos"? ¿Acaso el Señor no ha muerto por todos? El hecho que Jesucristo, como Hijo de Dios hecho hombre, sea el hombre para todos los hombres, el nuevo Adán, es una de las certezas fundamentales de nuestra fe. Querría a este respecto recordar sólo tres versos de las Escrituras. Dios "entregó por todos nosotros" a su proprio Hijo, dice Pablo en la carta a los Romanos (8, 32). "Uno solo murió por todos", afirma en la segunda carta a los Corintios a propósito de la muerte de Jesús (5, 14). Jesús "se entregó a sí mismo para rescatar a todos", se lee en la primera carta a Timoteo (2, 6).

Pero entonces se necesita preguntar otra vez: si esto es tan obvio, ¿por qué la oración eucarística dice "por muchos"? La Iglesia ha tomado esta formulación de los relatos de la institución del Nuevo Testamento. La usa por respeto de la palabra de Dios, para serle fiel hasta en la palabra. El temor reverencial ante la misma palabra de Jesús es la razón de la formulación de la oración eucarística. Entonces preguntamos: ¿por qué Jesús lo ha dicho así? La razón verdadera consiste en el hecho que Jesús, de esta manera, se ha hecho reconocer como el siervo de Dios de Isaías 53, que él se ha revelado como la figura anunciada de la profecía. El temor reverencial de la Iglesia ante la palabra de Dios, la fidelidad de Jesús a las palabras de la "Escritura": esta doble fidelidad es el motivo concreto de la formulación "por muchos". En esta cadena de reverente fidelidad nosotros nos introducimos con la traducción literal de las palabras de la Escritura.

Como hemos visto antes, el "por vosotros" de la tradición paolino-lucana no restringe sino que concretiza, por lo que ahora podemos reconocer que la dialéctica entre "muchos" y "tantos" tiene su importancia. "Todos" se mueve en el plano ontológico: el ser y el actuar de Jesús comprende a la humanidad entera, el pasado, el presente y el futuro. Pero de hecho, históricamente, en la comunidad concreta de los que celebran la eucaristía él llega sólo a "muchos". Se puede, por lo tanto, reconocer un triple significado de la atribución de "muchos" y "todos".

Primero de todo, para nosotros, que podemos sentarnos a su mesa, debe significar sorpresa, alegría y gratitud por haber sido llamados, por poder estar con él y poderlo conocer. "Demos gracias al Señor que, por su gracia, me ha llamado a su Iglesia...".

Sin embargo, después, en segundo lugar, hay una responsabilidad. La forma en que el Señor alcanza a los otros – "todos" – a su modo, en el fondo sigue siendo su misterio. Sin embargo, es indudablemente una responsabilidad ser llamados directamente por él a su mesa para poder oír: por vosotros, por mí, él ha sufrido. Los muchos tienen la responsabilidad por todos. La comunidad de los muchos deben ser luz en el candelabro, ciudad sobre el monte, levadura para todos. Esta es una vocación que concierne a cada uno de manera completamente personal. Los muchos, que somos nosotros, deben tener la responsabilidad del conjunto, conscientes de su misión.

Por último puede añadirse un tercer aspecto. En la sociedad actual tenemos la sensación de no ser en absoluto "muchos", sino muy pocos, una pequeña masa que sigue disminuyendo. En cambio, no: somos "muchos": "Después de esto, vi una enorme muchedumbre, imposible de contar, formada por gente de todas las naciones, familias, pueblos y lenguas" (Ap 7, 9). Somos muchos y representamos a todos. Por lo tanto, las palabras "muchos" y "todos" van juntas y hacen referencia la una a la otra en la responsabilidad y en la promesa.

¡Excelencia, querido hermano en el obispado! Con todo esto he querido indicar las líneas fundamentales de la catequesis, con la cual sacerdotes y laicos deberán prepararse lo antes posible a la nueva traducción. Deseo que todo esto pueda servir también a una participación más intensa en la celebración de la sagrada eucaristía, incluyéndose de este modo en el gran compromiso al que tendremos que enfrentarnos en el "Año de la Fe". Espero que esta catequesis esté pronto preparada, y que de este modo se convierta en parte de la renovación litúrgica para la cual el Concilio ha trabajado desde su primera sesión.

Con los saludos pascuales de bendición, suyo en el Señor.

Benedictus PP XVI

14 de abril de 2012

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Tempos de inconsistência

A concepção judaico-cristã sempre associou o termo glória ao peso, à densidade do impalpável, do eterno, do imorredouro. Sempre houve a glória intra-histórica, dedicada aos homens de valor, às autoridades ou figuras de respeito. Porém, o Ocidente, por uns séculos, buscou glorificar as realidades que merecem a glória, ou, antes, que a tem em si. E em função desta, glorificou, segundo uma ordem bem determinada, as referências que apontavam de alguma maneira para o eterno.

Porém, estamos em tempos de pulverização do impalpável, do eterno e do imorredouro, se é que é possível falar em pulverização de algo que, de per si, não pode ser quebrado. Quem se quebra é o homem. Sim, sua base é sua filosófica, seu conhecimento, sua sabedoria, enfim, seu Deus. Seu fundamento seria uma referência absoluta que o levasse a compreender o sentido que sua vida leva e a saudade que tem de algo que lhe transcende. Mas se o homem pulveriza o que há de criado a partir disso dentro de si (sim, há um Deus e uma imagem de Deus em si, há uma sabedoria eterna e uma sabedoria criada e, quando possível, desenvolvida, no homem, o conhecimento, as idéias, as relações, etc.), já não há mais possibilidade de verdade nele. Diz o Salmo 115, "todo homem é mentiroso, todo homem". Isso se torna radical aqui.

O espetáculo que assistimos hoje se deve a essa pulverização dos fundamentos do humano. As glórias são aparentes, as verdades já não são ditas, nem vividas. Estamos em tempos de inconsistência, de inanição interior. O colapso total é questão de tempo.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Sobre o abortamento como bandeira ideológica e outras práticas...

Sabemos, como sociedade formada e informada, que diversas ONG's nacionais e (sobretudo) internacionais fomentam a formação de grupos sistematicamente organizados para divulgar, defender e promover estas práticas no país. Entretanto, é publicamente conhecida a aversão da maioria da população brasileira a tais práticas.

É ainda conhecida a série de discussões filosóficas e científicas acerca do começo e do fim da vida. Gostaria de situar um pouco daquilo que honestamente posso observar acerca do conceito de vida. Desde quando o ser humano existe sobre a superfície terrestre, o desenvolvimento da civilização tem se mostrado nos momentos em que ele se nota um ser para os outros. De fato, o próprio surgimento daquilo que comumente se chama natureza, procede de acontecimentos fisicamente improváveis e decorre de uma série de fatores assim notados pelas ciências físicas que conferem um equilíbrio ainda não totalmente compreendido. Dentro da dinâmica do processo de desenvolvimento orgânico da assim chamada natureza, a própria irrupção do homem e sua permanência como ser a ela integrado é algo ainda mais improvável, procedente de um profundo exercício da vontade, da inteligência e dos sentimentos. Foram tais elementos que levaram o homem a uma verdadeira batalha, não diria contra a natureza, mas em profunda tensão com ela. As relações do homem com a natureza nem sempre foram das mais harmoniosas, mas houve, por longos e longos séculos, a compreensão de que essa tensão exigiria uma série de atitudes, que hoje, com a compreensão que temos, poderíamos chamar de sacrifícios.

De uma forma geral, a manifestação das propriedades dos elementos da natureza são uma maneira sacrifical de existir, onde aquilo que não era expresso, passa a ser expresso, nomeado e caracterizado pelo homem, em função de transformações as mais diversas, que viriam em favor de um devir. O que seria esse devir?

Não é difícil afirmar que estamos diante de um esforço para a preservação da espécie humana e de um cuidado especial para com a prole. Ou seja, ao longo do desenvolvimento orgânico da consciência humana sobre a superfície terrestre, esta apontou para o fato de que o homem provinha de um sacrifício e estava destinado a isso se quisesse ver a alegria de sua família, de seu clã e de sua nação. O desenvolvimento das civilizações se deu quando essa consciência estava aguçada e firmemente estabelecida  no seio da sociedade. Quando essa consciência se desligava desse fato, sérias inflexões ocorriam, como acontecera no Império Grego e no Império Romano.

O desenvolvimento da cultura, das ciências e das artes no Ocidente seguiu essa linha de ação e de consciência e a maioria das realidades que dizem respeito ao desenvolvimento científico e tecnológico de que hoje desfrutamos se deve a esse papel da civilização ocidental.

Com esses parágrafos, gostaria de afirmar primeiramente: o homem é uma realidade de sacrifício. Surgiu através de um, sua vida encontrará significado nas diversas entregas de sua história, até que venha, se assim permitido, expirar no sacrifício último de sua vida, tendo exalado nos seus últimos dias sabedoria para as gerações em função das quais este ser foi sacrificado do começo ao fim.

Porém, vemos aqui o homem sacrificado, mas ao redor dele, se assim podemos nos expressar, temos um jardim: uma juventude (seus filhos e netos) cheia de significado, encontrando nas diversas realidades aquela saudável tensão com a natureza e com seus pares; obras as mais diversas, seja nos serviços mais simples, seja no desenvolvimento da ciência e da tecnologia, seja no atendimento a doentes e agonizantes, seja ainda na transmissão do conhecimento, seja enfim no envolvimento positivo em decisões políticas que levem seu país a se tornar um modelo de humanidade para todas as nações. O que brevemente quis expor aqui é que essa realidade sacrifical de onde o homem vem (gratuitamente, por meio de um ventre feminino) e para onde se destina (naturalmente, através de uma vida sábia) não permite, honestamente, dizer que a vida pertence a si.

Também não pertence à arbitrariedade dos Estados, como já se pode observar em certos países (que não demoram a entrar em colapso). Diria que a vida é algo maior do que o homem, que ela contém o homem, mas que este jamais pode dispôr dela. No sentido de que, quanto mais conhecemos algo acerca da vida, mais percebemos que temos muito a conhecer, uma conclusão natural deste fato é a de que a vida é um mistério. Definir a vida, esquadrinhar a vida, encapsulá-la ou, por fim, esquartejá-la é algo cujas consequências mais radicais podem não ser controláveis em médio prazo.

Quando afirmo isso, penso, por exemplo, no Império Romano, que, depois de períodos de pujante riqueza, mas de profundas arbitrariedades sobre a vida, sobre quem deveria viver ou não, começou a entrar em grande colapso, até o momento em que os bárbaros, vindos do norte da Europa, saquearam-no por completo, e este continente teve de conviver, pelo menos, 200 anos num universo de falta de sentido para o ser humano, e completa desagregação social. Poderíamos elencar algo de certos abusos que ocorreram quando membros do clero europeu, pelos idos dos 1400 aos 1600, também assim interpretaram certo domínio sobre a vida e mesmo as instituições eclesiásticas passar, por sérios colapsos entre os séculos XVI e XVIII. Porém, as mais horrendas manifestações de arbitrariedade encontraram suas expressões nos regimes nazi-fascistas e comunistas do século XX. Os primeiros, além de matar mais de 6 milhões de judeus, além de outros inimigos do regime, conseguiram energizar uma grande guerra em que outros tantos foram vítimas, num desejo insano de estabelecer uma hegemonia racial. Os outros, já desde a revolução bolchevique até as demais herdeiras, conseguiram destruir cerca de cem vezes mais vidas do que os regimes nazi-fascistas ou quaisquer outros. Bem, hoje vemos países extremamente pobres (como Cuba, Albânia ou Coréia do Norte) ou extremamente caros (como a própria Rússia) ou extremamente opressores (como a China).

Trocando em miúdos, independente da corrente que se siga, dispor da vida alheia é sempre um risco para a própria nação. Mesmo que um cidadão não venha a acreditar num devir após seu período de existência na terra, pode-se pensar num devir aqui. A idéia de dispor de vidas, decidindo-se sobre quem devia viver ou não, proveio não raras vezes da idéia de construir  uma vida com qualidade perfeita na superfície da terra. Até hoje, com tudo isso, não conheço nação que a tenha encontrado, pois, mesmo quando se chega a níveis máximos de IDH, o índice de suicídios (assistidos ou não) também os acompanha... Ao menos, assim acontece nos Flandres e na Escandinávia.

Fala-se, pois, do direito da mulher. Diz-se de que ela é dona do próprio corpo. Não entendo que seja, como eu, um homem, também não o sou. Ainda que fosse dona, um nascituro, um zigoto, um embrião, um feto, um bebê, não faz parte de seu corpo. É outro ser, traz em si todas as informações genéticas que o irão individuar. Mesmo que o corpo da mulher lhe pertencesse, a criança não lhe pertenceria.

A propósito, há pouco dizíamos algo sobre sacrifício. Há sacrifício que gera vida, que planta um verdadeiro jardim no universo; há também sacrifício que gera morte e desgraça. Como realizar um aborto e sentir-se com a consciência livre, capaz de juistificá-lo e até defendê-lo? A realidade observada é que a maioria das mulheres que o fazem, voluntariamente ou não, trazem uma marca terrível em sua consciência e prefeririam esquecer daquele momento de sua história. Mas isso é impossível.

Eu arriscaria responder à pergunta: somente quando há uma resoluta e inarredável decisão em afirmar, até onde é possível ao ser humano, que a vida pertence a si, ou seja, ele é maior do que a vida. Se é maior de que esse mistério, o que mais seria mistério? E o que mais seria inextricável e mesmo respeitável? Essa auto-afirmação seria o princípio do colapso civilizacional.

As instituições que, por outro lado, fomentam o infanticídio (igualmente a eutanásia) estão movidas por propósitos que estão além de minha compreensão, mas parece muito coerente com a prática vigente de só preservar aquilo que tem valor agregado a curto prazo. Crianças (a depender de como elas venham ou de como as mães fiquem) e idosos não são assim para tal lógica. E mais uma vez, decide-se sobre quem deve ou não viver.


sábado, 7 de abril de 2012

"Surréxit Christus, spes mea!" - "Ressurgiu minha esperança, Cristo!"


Queria dirigir a todos uma palavra sobre a hodierna Páscoa: 

"era necessário que o Cristo sofresse para assim entrar em sua glória". 

O caminho assumido por Deus para o nosso resgate foi o caminho em que acabamos caindo por causa de nossos pecados. Poderia ser outro, mas o quis assim para que tivéssemos como segui-lo. Foi um caminho humano, por excelência, carregando em si uma pedagogia que não nos anulasse, mas, ao contrário, levasse em consideração a nossa fraqueza e nossa condição desastrosa.
 
Mais ainda, foi o caminho em que assumiu Ele mesmo se anular, em certo e misterioso sentido, para percebermos algo da incomensurável nulidade, vacuidade, vaidade e caducidade que havia dentro de nós.
Creio, pois firmemente, hoje, nesta Páscoa de 2012, que foi ao deixar que Ele entrasse em minha vacuidade, murmurações, quedas, feridas abertas, tentações, angústias, lágrimas, dificuldades e provações as mais diversas, que pude experimentar mais um pouco da força de seu Mistério, de sua entrada neste mundo, em minha vida até a raiz, desvelando algo mais do livro selado de minha existência aos meus próprios olhos, aos olhos do coração, olhos da alma. Se não consegui segui-lo e ser fiel em tudo, Ele o sabe. Sabe-o mais do que eu, embora por essa radical entrada me desafie sempre mais a que eu mesmo o saiba e possa ser transformado por esse diálogo proporcionado por pura e graciosa iniciativa dEle, desde dentro do diálogo intratrinitário que acontece na eternidade. E quem, até mesmo entre os filósofos, poderia esperar tão grande Mistério, eles perscrutadores de tantos mistérios?

Não é à toa que posso hoje chamar a Cristo de meu, posso não porque o tomei, mas porque, de algum modo, Ele me tomou. Sua benevolência, sua (tão paradoxal) magnificência, sua paciência para comigo, ao carregar minha cruz, ao morrer onde morro e já não sou mais o eu sonhado pelo Pai do céu, o eu verdadeiro, e, no seu eterno vínculo com o Pai do céu, o Espírito Santo, me levar, de cativo ao alto (cf. Sl 67), pelo grandioso Mistério da Ressurreição, enche-me de santa esperança, e me leva cantar o Aleluia ao varar esta Noite que se inicia. Quando eu ver aquela lua cheia brilhando hoje, aquele círio aceso, as velas acesas em nossas mãos, poderei renovar a certeza de fé que me move para adiante em meio aos percalços da vida, aquilo mesmo que o discípulo amado diz no prólogo de seu Evangelho: "a luz brilha nas trevas, e as trevas não conseguiram dominá-la". Sim, porque a luz tem mais direito que as trevas...

Poderei, ainda, ao ouvir o Exultet, o Santo Precônio desta noite, que os anjos cantam conosco e que as criaturas do céu e da terra estarão em uníssono e , ainda que em esperança, de esperança em esperança, podem sonhar com o Dia Eterno em que, para além do que podemos ver, ouvir, pensar, planejar, Cristo, imolado por nós, será tudo em todos.
Assim, e por isso, meu caro irmão, minha cara irmã, não pude resistir em expor aqui meus sentimentos às portas da Páscoa. Quero colocar cada um de vocês no Aleluia que sairá de meus lábios. Quiçá cantemos todos o Aleluia, porque eterna é a misericórdia, a caridade, o amor de Nosso Deus, manifesto em Nosso Senhor Jesus Cristo. De fato, Ele nos cativou, como lembrava uma das antífonas da tarde de ontem, Sexta-feira Santa, em alegre modo gregoriano VIII: “o fruto da vida nos atraiu”.

A Ele, Alfa e Omega, Princípio e Fim, a honra, a glória e o louvor, o poder e a salvação, ontem, hoje e sempre, por toda a eternidade, pelos séculos dos séculos. Amém!
E a você, meu caro irmão, minha cara irmã, o desejo, do fundo do coração, de uma Santa e Feliz Páscoa, nEle!