segunda-feira, 30 de junho de 2008

"Seguir-te-emos aonde quer que vás"

A Sagrada Liturgia é sempre uma fonte de inspiração para os movimentos daquele que se sente impulsionado por esse magnetismo grandioso que nosso Deus exerce em nós. Os rituais das tradições sempre moveram os homens das diversas culturas. Que o Ocidente não esqueça de suas raízes cristãs. Foi aí, afinal, que o cristianismo o ergueu de seus escombros, séculos atrás.

Mas, dentro de nosso contexto 'epectático', surgiu dentro da Sagrada Liturgia, hoje celebrada, uma frase que poderia ser nossa. Depois de Jesus reinterpretar a Lei, no Sermão da Montanha, e de curar a muitos, um escriba se anima e diz: "Nós te seguiremos aonde quer vás!" Interessante é que essa frase vai ser igualmente repetida por Pedro, pouco antes da Paixão, e Jesus irá responder: "negar-me-ás três vezes antes que o galo cante". E, no fim, Jesus permanece sozinho. O escriba está muito animado. É ainda o começo da vida pública de Jesus. É o início do contato com Ele. Precisa ser provado.

Não é à toa que Jesus responde: "as aves têm seus ninhos, e as raposas têm suas tocas, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça". Lembremos: no fim, Ele permanece na mais profunda solidão humana: "meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?" No fim, nem no Pai Ele poderá reclinar a cabeça. No fim, só a cruz será o espaço para reclinar a cabeça. Depois, sua sepultura.

Jesus revela ao escriba sua singularidade radical, típica do homem. O homem é só. Sim! Não se espante! Você é só! Mas não há nada de anormal nisso: você, meu caro leitor, é gente. Há quem pense que foi feito para os pais, para os filhos, para o esposo, para a esposa, para o trabalho, para o futebol de fim de semana, para a paróquia, para a curtição de sábado à noite... No fundo, se isso lhe falta, perde-se o chão, o sentido, o oriente da vida. Essas perdas nos revelam: o homem é só. O estar com o outro é apenas um meio de aprender a ser só. O estar com o outro proporciona a ele que possa sentir-se mais à vontade com sua solidão, sentir seu interior, conhecer-se. Igualmente, a relação proporciona, através da escuta, uma experiência de transcendência, de sair de si, de ir para muito além de si, uma terra estrangeira, onde posso descobrir meu papel. Essa terra estrangeira se chama: o Outro. Essa terra é aquela à qual Abraão foi chamado a buscar. Foi lá que Moisés teve de tirar as sandálias, em sinal de profundo respeito. Foi lá, onde Jesus ressuscitou da morte...

Pai Alônio, no deserto Scetia, região do Alto Nilo, disse uma vez: "se o homem não disser em seu coração: 'somente existimos eu e Deus', não conseguirá tranqüilidade de espírito". Esse apoftegma de alguém profundamente provado no deserto da vida reflete com bastante precisão o que representa a solidão na vida humana. É sua condição radical. É ali que encontra a paz. Sua felicidade não depende de outros, bem como sua infelicidade. Cuidado, aqui! Não significa isolamento. Significa saber-se só em si mesmo, saber-se um em si mesmo. Só assim poderá ir ao encontro dos outros livremente, nada esperando deles em troca.

A esse respeito, também escreve São Gregório Magno, ao narrar o início da biografia de Nosso Pai São Bento, que fugiu para Subiaco para estar consigo mesmo. Eis o desafio de um ser humano por toda a vida: estar consigo mesmo. Não significa que cada um de nós deva se retirar para uma gruta, uma selva, um ermo ou um deserto para tal. Isso é vocação apenas para alguns. Em outros casos, pode ser uma patologia. É importante, entretanto, lembrar do que isso significa: na vida, encontraremos sempre o deserto, por mais que tentemos nos afastar dele. O outro será nosso deserto. Ele sempre desmascarará nossas ambições, nossos caprichos, nossa vontade doente. Grandes lutas se travarão aí. O problema é que se essa luta não se der dentro de si, dar-se-á fora. E assim surgem os problemas, as guerras interpessoais, que, conforme lembra São Tiago Apóstolo, são provocadas pelas paixões em conflito dentro de nós.

Não nos iludamos: também nós não temos onde reclinar a cabeça. Procuramos um colo, um travesseiro, um apoio. Não nos apeguemos a eles. Pode ser que amanhã já não o sejam. E nós? Deixaremos de ser por isso?

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