domingo, 27 de novembro de 2011

Deus não tem prazer em condenar, mas em salvar

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo
               O nosso Deus vem manifesto e não se calará (Sl 49, [50], 2). Cristo Senhor, nosso Deus, o Filho de Deus, que veio oculto no primeiro advento, virá manifesto no segundo. Quando veio oculto, revelou-se apenas a seus servos; quando vier manifesto, se revelará aos bons e aos maus.
               Quando veio oculto, veio para ser julgado; quando vier manifesto, virá para julgar. Quando foi julgado, calou-se, e de seu silêncio havia predito o Profeta: Como um cordeiro foi conduzido ao matadouro; como uma ovelha que permanece muda na presença de seus tosquiadores, ele não abriu a boca (Is 53, 7).
               Mas o nosso Deus vem manifesto e não se calará. Quando vier para julgar, ele não se calará como quando veio para ser julgado. Desde agora não se cala, se há quem o escute; mas foi dito: não se calará, quando então mesmo os que presentemente o desprezam reconhecerão a sua voz. Agora, quando se declaram os preceitos de Deus, alguns chegam a rir. Como não se mostra ainda o que Deus prometeu, nem se vê o cumprimento de suas ameaças, eles se riem dos seus preceitos. Por ora, com efeito, a felicidade dita deste mundo, também os maus a têm; e a infelicidade dita deste mundo, também os bons a possuem.
               Os homens que crêem nas realidades presentes, mas não nas futuras, observam que os bens e os males do mundo atual cabem indistintamente aos bons e aos maus. Se querem riquezas, vêem tanto homens bons como homens péssimos as possuírem. Vêem também, se detestam a pobreza e as misérias deste mundo, que delas sofrem não só os bons, mas também os maus. E dizem em seu coração que Deus não se ocupa das coisas humanas, mas nos deixou completamente abandonados ao acaso, nos confins deste mundo, privados de qualquer providência. Por isso, se instala neles o desprezo pelos preceitos, porque não vêem a manifestação do juízo.
               Contudo mesmo agora, todos podem perceber que Deus, quando quer, olha e castiga, sem deixar para depois; porém, quando quer, pacienta. E por que? Porque se jamais castigasse no presente, não se acreditaria em sua existência; se, por outro lado, condenasse tudo desde agora, nada reservaria para o juízo. Muitas coisas são, pois, reservadas para o juízo, e algumas julgadas no presente, para que temam e se convertam os que têm sua vez adiada. Deus não tem prazer em condenar, mas em salvar; por isso é paciente para com os maus, a fim de torná-los bons. Diz o Apóstolo que a ira de Deus revela-se contra toda impiedade (Rm 1, 18) e que Deus retribuirá a cada um segundo as suas obras (Rm 2, 6).
               Na verdade, o Apóstolo admoesta e repreende o desprezador, dizendo: Acaso desprezas as riquezas de sua bondade, de sua tolerância? (Rm 2, 4). Porque ele é bom, tolerante e paciente para contigo, poupa-te e não te destrói, não fazes caso, pensando que Deus não julga, desconhecendo que a bondade de Deus te convida à conversão. Por causa de teu endurecimento e de teu coração impenitente, estás acumulando ira para ti mesmo, no dia da ira, quando se revelará o justo juízo de Deus, que retribuirá a cada um segundo as suas obras (Rm 2, 4-6).

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